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Nota de repúdio à intervenção militar no Extremo Sul da Bahia

Por Comissão Pastoral da Terra-CPT

A Comissão Pastoral da Terra – CPT Nordeste III – Bahia, há 45 anos dedicada a apoiar povos e comunidades do campo na conquista e permanência com dignidade na terra, repudia a ação do Ministério da Justiça e Segurança Pública que, por meio da Portaria n° 493, de 01 de setembro de 2020, autoriza a Força Nacional de Segurança Pública – FNSP a intervir nos assentamentos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra -MST, nos municípios de Mucuri e Prado, no Extremo Sul do Estado da Bahia.

O pedido da intervenção – arbitrário e ilegal, porque sem respaldo da autoridade estadual – foi feito pelo Secretário Especial de Assuntos Fundiários, Nabhan Garcia, ex-presidente da União Democrática Ruralista – UDR, que representa os interesses ultrareacionários da burguesia agrária neocolonial, em ascensão em nosso estado e no país, sob o totalitarismo de Bolsonaro.

A luta pela terra é antiga no Extremo Sul da Bahia. Da invasão dos portugueses à invasão das empresas de eucalipto / celulose, houve muitos e violentos conflitos que resultaram na estrutura político-econômica que hoje controla a região. Dos 1970 para cá, foram vários os investimentos federais e estaduais a serviço destas empresas, sob a falácia do “desenvolvimento” e do “progresso” – na prática, emprego e renda para poucos/as, marginalização social para a maioria e devastação ambiental para tudo e todos/as. Povos de tradição milenar, como os indígenas, e secular, como os quilombolas e posseiros, foram simplesmente enxotados. Mas resistiram e ressurgiram em muitas lutas territoriais e nos acampamentos e assentamentos do MST, que chegaram a controlar mais de 35 mil hectares de terra, que cultivam alimentos saudáveis, com preservação ambiental. Na direção do que exigem o enfrentamento das mudanças climáticas e a proliferação de pandemias, que a todos/as atingem.

É lei da natureza que a terra pertence a quem nela re-produz a vida. Daí que a terra não pode ser objeto de negociatas econômicas e políticas – que restringem e negam sua natureza –, muito menos ficar à mercê de arroubos de latifundiários golpistas. Enquanto os trabalhadores/as rurais e povos e comunidades tradicionais plantam alimentos saudáveis e vendem a preços justos na região, os latifundiários do eucalipto e da pecuária de exportação, em vista do lucro máximo a qualquer preço – o qual não pagam –, concentram a terra, destroem a natureza e os meios de vida e expulsam aqueles/as que só têm sua porção de terra/natureza para sobreviver.

É necessária e urgente a solidariedade da sociedade civil organizada e dos representantes dos partidos políticos democráticos para que se desfaça essa intervenção. Não é aceitável que um ente federal recorra ao Ministério da Justiça sem que haja uma mediação do Governo do Estado. Ou isto já não é mais uma Federação? Tal atitude abre grave precedente para que os Estados percam sua autonomia garantida na Constituição de 1988 e que trabalhadores/as do campo e da cidade tenham seus direitos destruídos pela força e que a democracia se converte numa autocracia ou plutocracia.

A Comissão Pastoral da Terra – CPT Bahia está acompanhando o caso e denunciará todo o tipo de violência. Estaremos ombro a ombro com os trabalhadores e trabalhadoras rurais dos assentamentos ameaçados, em nome da vida e na construção de uma sociedade igualitária baseada no bem viver.

“Malditas sejam todas as cercas! Malditas todas as propriedades privadas que nos privam de viver e de amar! Malditas sejam todas as leis, amanhadas por umas poucas mãos, para ampararem cercas e bois e fazerem da terra escrava e escravos os homens!” (Pedro Casaldáliga)

Salvador 05 de setembro de 2020.

Comissão Pastoral da Terra / Regional Nordeste III – Bahia